Não é só o mundo corporativo que se preocupa em orientar funcionários a se comportarem nas redes sociais. Em uma época em que boa parte das relações de amizade se dá no mundo virtual, professores também precisam estar preparados para interagir adequadamente com seus alunos fora da sala de aula. Para a pedagoga especialista em Tecnologia Educacional Lígia Leite, deve haver limites na relação online entre educadores e suas turmas. "A cada nova tecnologia vêm novos desafios. A pergunta atual é qual o papel do professor nessa era de redes sociais. Hoje, está todo mundo fazendo o que quer, não existe um consenso e deveria existir", diz. No estado de Missouri, nos Estados Unidos, uma barreira nesta relação virtual foi imposta recentemente. A lei número 54, considerada a primeira a regulamentar a interação aluno-professor em redes sociais, entra em vigor no dia 1° de janeiro de 2012. A partir de então, ficarão proibidos registros de amizade no Facebook entre estudantes e educadores. O objetivo é impossibilitar a troca de mensagens privadas via rede social, com o objetivo de prevenir o abuso sexual infantil. Para conversar com os estudantes no site de relacionamento, professores poderão criar páginas públicas. Assim, alunos poderão "curtir" a página e manter contato com o educador transparentemente, aos olhos de todos.
Além disso, também fica estabelecido que cada escola deve determinar políticas comunicacionais entre estudantes, professores e funcionários. O documento deve tratar do uso apropriado de mídia eletrônica, incluindo sites de relacionamento. Apesar de achar a lei válida e interessante, uma vez que estabelece como deve ser o comportamento profissional do educador na internet, Lígia acredita que tal iniciativa não teria êxito no Brasil. "Pelo menos não com o objetivo de evitar o abuso sexual", explica.
Também professora da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Ligia lecionou por anos nos Estados Unidos e conta que, no país, o medo de abuso sexual de menores é intenso e, por isso, a relação aluno-professor é muito diferente da que existe no Brasil. "Somos latinos. Aqui a gente se abraça, se toca e tem uma relação de carinho com os alunos. Lá, não. Aqui a lei com esse intuito não faria sentido nenhum, pois esse medo não faz parte da cultura brasileira", diz. A especialista afirma que aqui a iniciativa deveria partir de cada escola. "O professor não deve achar que pode participar das interações sociais do aluno como se fosse outro aluno. A relação pedagógica deve permanecer no meio virtual também. São as instituições de ensino que devem estabelecer essa relação", afirma. Ela destaca, porém, que não significa que o educador não pode ser amigo de aluno, mas que deve continuar agindo como profissional nas redes sociais. "O problema é que esse conceito é complexo, por isso, não pode caber somente ao professor decidir qual a melhor forma de agir. A escola que deveria orientar seus profissionais, assim como já os orienta em suas relações em sala de aula", complementa.
Família deve orientar comportamento de estudantes na internet - Semíramis Alencar, professora de sociologia no ensino médio de uma escola de Itamonte (MG) mantém relação de amizade com alunos no Facebook e no Orkut. Para ela, a família deveria orientar seus filhos no meio virtual, assim como professores precisam explicar para seus alunos no que consiste sua relação de amizade. "Teoricamente só podem participar das redes sociais pessoas maiores de 18 anos. E isso acontece porque crianças realmente não sabem se proteger. Mas eles participam mesmo assim, e, como professores, não temos como não os aceitar". Apesar de achar que o cuidado deveria partir da família orientando seus filhos e controlando o acesso deles ao meio virtual, Semíramis afirma que cabe também ao professor conversar com os alunos e estabelecer os limites de amizade dessa relação no meio online. Para ela, o educador pode ser amigo, mas sem deixar de ser profissional. "Eu uso Orkut e Facebook para tirar dúvidas e, nessas interações, procuro ser amiga, pois o laço de confiança é essencial para que o processo de aprendizagem aconteça", opina.
Professor de geografia de uma rede estadual de ensino em Indaiatuba (SP), Ricardo Pignatelli conversa com estudantes no Facebook, Twitter, MSN e Orkut. Para ele, a interação é de amizade sem deixar de lado seu caráter pedagógico, uma vez que faz uso dessas ferramentas para tirar dúvidas e atualizar os alunos com notícias relacionadas à disciplina. Pignatelli conta que alguns alunos acabam confundido essa relação. "Infelizmente, o Facebook também pode ser uma bela ferramenta de fofocas. Então, o professor deve explicar aos seus alunos em sala de aula que o que ele escreve na rede social é uma opinião própria, e que nem sempre é a opinião da maioria ou dos alunos", diz. Para ele, a criação de uma lei como a do estado americano é sinônimo de censura e cerceamento da liberdade individual de cada um.
Escola orienta seus professores nas redes sociais - Na Escola Crescer PHD, em Vitória (ES), os professores recebem orientação sobre a forma mais adequada de agir nas redes sociais e principalmente sobre como usar o meio virtual como ferramenta de ensino. Segundo o professor de português, Ricardo Carlos de Souza, a direção promove aulas para que a relação nas redes seja discutida entre todos. De acordo com Souza, as ferramentas online são utilizadas para realizar atividades educacionais, que recebem acompanhamento e autorização prévia da escola. Além disso, antes de aplicar um exercício que faça uso do Twitter ou do Facebook, os professores dão aula presencialmente sobre o meio virtual, na qual o objetivo é explicar a diferença de linguagem utilizada na internet e na sala de aula. Neste ano, todos os professores da instituição começaram a receber treinamento para também fazer uso das redes sociais como um meio de contato com os estudantes fora da escola. A ideia é estar sempre à disposição do aluno para tirar dúvidas, principalmente daqueles em fase de realizar as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e de vestibular.
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